03 setembro 2009
Regressado de Férias e novamente no ar
27 julho 2009
Época de transformação
21 julho 2009
Uma espécie de desabafo...
14 julho 2009
A magia do jazz... Gostar e porquê?
Para os que me conhecem, ou vão conhecendo e se têm passeado pelo meu blog sabem que sou amante de jazz. Ora, colocar um post sobre jazz não seria, por certo, novidade. Mas, a verdade é que este não gera o interesse que, na minha opinião, devia no público em geral.
Ao longo dos anos tenho ouvido as mais diversas questões:
“Porque gostas “disso””?
“Não é um estilo de música “velho””?
“Ver um concerto de jazz? Bah… que seca”
Etc…
O jazz não se gosta, sente-se. Não é velho, muitoooooo pelo contrário e já explicarei. Seca é gramar com as novelas da televisão nacional.
Pois bem, o que é o jazz? O link http://pt.wikipedia.org/wiki/Jazz pode-vos dar uma ideia bastante generalista do que este representa, em termos históricos. Mas, o que realmente importa não é o que o jazz, é sim aquilo que faz sentir. E perguntam vocês:
- “O que faz ele sentir?”
Eu respondo:
-“Tudo!” lol
De facto o discurso jazz, ao longo dos tempos, sempre esteve ligado a quase todos os assuntos: amor, tristeza, alegria, euforia, morte, sexo, drama, paixão, loucura, êxtase, etc… O jazz sempre se ocupou em “musicar” esses sentimentos e situações de uma forma bem mais natural, sentimental e lírica que outros estilos. Fá-lo de uma forma tão honesta que nos anos 40/50/60/70 chegava perfeitamente às massas e agora tal não acontece. Porquê? Isso abre pano para mangas e que talvez não seja o melhor dos tópicos. Não porque seja mau, mas sim porque se torna incómodo e discutível em meios menos esclarecidos. No fundo, digamos que o público se desleixou ou se acomodou a um certo facilitismo institucionalizado. Enfim.
Mas o jazz é uma forma de encarar o mundo, escrever e pintar com sons.
- “Porque achas então tem o jazz tem mais magia que o rock? o metal? a dance music? o pop? E por aí…”
Talvez porque o faça de uma forma que nos conecta com o universo e com as raízes, porque existe uma espécie de energia cósmica num solo improvisado, no clímax de uma performance. Há algo de transcendente e ao mesmo tempo completamente terreno e humano. É verdade que falamos de som, organizado de forma a seguir uma determinada estratégia estilística e uma manifestação própria, mas som! Com toda a grandeza ou pequenez que se lhe queira atribuir. Aliás, para quem possa não saber (espero que todos saibam!), som é vibração. Essa vibração gera ondas que se convertem em impulsos interpretados pelo nosso ouvido e analisados pelo nosso cérebro como manifestações sonoras. O interessante é que tudo na natureza está em constante vibração/movimento. Até uma rocha! Aqui entra a dimensão atómica. Os átomos também se encontram em permanente movimento, o que prova que, de facto, tudo é som.
- “O que faz pois haver quem goste de um estilo e não do outro?”
Vários factores: a educação (na minha opinião o predominante); o preconceito; o nível social (curiosamente este só se manifesta nos nossos dias, já que o jazz nasceu no seio dos emigrantes negros americanos, envolvidos na pobreza de quem pelos EUA se refugiou à espera de melhores oportunidades ou, mais cruelmente, como escravos); a falta de personalidade (demasiadas pessoas tendem a assumir comportamentos de massa dentro da unidade grupal em que se encontram); o medo da diferença (semelhante ao preconceito); a pura e simples ignorância; a própria estrutura orgânica do nosso ouvido e das conexões cerebrais; etc…
Antes que me crucifiquem, posso-vos assegurar que a resposta à questão acima apenas com um: “porque eu gosto e pronto” não é de facto resposta. Os nossos gostos são baseados nas experiências de vida, numa relação de feedback positivo ou negativo, associado ou não a outras circunstâncias marcantes, dessas mesmas experiências. Quero com isto dizer que, aquilo que alguém toma como bom hoje, teve um impacto positivo numa qualquer situação semelhante no passado. Não precisa de ser necessariamente igual, mas semelhante. Somos frutos das nossas construções pessoais e nelas baseamos aquilo que é o nosso gosto. Prova disto são os estudos, cada vez em maior número sobre o efeito da música nos bebés e recém-nascidos, cujo efeito da personalidade ainda não é absolutamente manifestado.
Voltando ao tema, o jazz e os blues são os pais de praticamente tudo o que se faz actualmente na música num contexto ocidental. O jazz faz 90 anos mais ou menos. Continua a reinventar-se diariamente, muito mais que rock. Nos dias que correm, devido ao seu espírito de profunda base musical funde-se com o pop, rock, funk, blues, música latina, flamenco, bossa-nova, música celta, sonoridades asiáticas, com a dance music, world music, fado, etc… Trata-se pois de uma manifestação profundamente actual, nascida muito à frente do seu tempo e talvez incompreendida por isso. Os ouvintes e músicos de jazz não são uma “elite” ou “intelectuais”, como muitos lhes teimam em chamar. São, infelizmente por cá, uma minoria.
Se por acaso algum ouvinte de jazz me estiver a ler, certamente, compreenderá tudo aquilo que até ao momento escrevi.
A Improvisação
Finalmente, importa dizer que o jazz introduz algo na música que até então apenas Johann Sebastian Bach (Eisenach, 21 de Março de 1685 — Leipzig, 28 de Julho de 1750), tentou fazer de forma dissimulada. A IMPROVISAÇÃO, essa forma de arte maior que foi “inventada” pelo jazz e pelo génio dos seus “criadores”. A capacidade de se reinventar uma música a cada vez que se toca é algo que só pode atrair. O rock, metal, pop, etc… tentam introduzir alguma dessa linguagem hoje em dia, mas o que é facto é que a mestria continua e sempre continuará a vir do legado dos grandes mestres. Esses homens primeiros que organizaram e compilaram aquilo que, tomamos hoje por adquirido, em termos de teoria e prática musicais. A música clássica sempre viveu á parte do jazz. Sempre olhou para este com respeito, mas, ainda assim, em parte desvalorizando-o como “música não erudita”. O conhecimento técnico dos instrumentos numa fusão próxima com o conhecimento teórico, faz com que aprender a improvisar seja uma aprendizagem a longo prazo, nunca completa na vida de um músico e que, se vai recriando e interagindo com o meio musical envolvente.
Quem nunca ouviu, que se deixe contagiar 10 minutos por dia com a magia do jazz. Ele pode mudar a tua vida!
Deixo-vos uma pequena síntese informativa dos principais nomes e correntes (imensamente mais havia para acrescentar), em ordem pela qual, o jazz, se foi desenvolvendo.
* Ragtime - 1880/1990 (Scott Joplin)
* Blues - 1900/1920 (Ma Rainey, Bessie Smith, W.C. Handy)
* Dixieland - 1917/1920 (Louis Armstrong, Jelly Roll Norton, King Oliver)
* Big Band (Swing):
- Inícios - 1920 (Flectcher Henderson, Paul Whiteman)
- "Boom" - 1930/1940 (Woody Herman, Count Basie, Duke Ellington)
- Pós-Gerra até ao Presente - 1940 (Stan Keaton, Buddy Rich, Maynard Ferguson)
* Latin Jazz - 1930 (Dizzy Gillespie, Stan Keaton, Airto Moreira)
* Bepbop - 1940/1950 (Dizzy Gillespie, Charlie Parker)
* Cool Jazz - 1940/1950 (Miles Davis, Bil Evans, Wes Montgomery)
* Hard bop - 1950 (Art Blakey, Miles Davis, Horace Silver)
* Post bop - 1950/1960 (Miles Davis, Julian "Cannonball" Adderly, John Coltrane)
* Free Jazz/Avant Garde - 1950/1960 - (Ornette Coleman, Cecil Taylor)
* Fusion - 1970 (Chick Corea, Pat Metheny, Weather Report)
* Post Modern Jazz - 1970/1980 (Charlie Haden, Muhal Richard Abrams, Keith Jarrett)
Beijinhos e abraços para todos
João
09 julho 2009
O calor é inimigo dos telemóveis
05 julho 2009
Depois da confusão...
"Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma"
Beijinhos e abraços a todos
João
02 julho 2009
Apenas um dia - Conto/Romance Parte 3
Era necessário procurar o responsável pela barbárie.
Dirigi-me à sala, peguei no telefone e contactei o 118. Minutos depois uma ambulância e um carro da polícia encarregavam-se de despertar toda a vizinhança, que depressa acorreu numa incursão de pijama e trajes menores, invadindo o jardim. Irritado com a falta de descrição, que a situação impunha, procurei, educadamente, afasta-los. De nada serviu. Pareciam ter tendência à morbidez.
A polícia judiciária acabaria por chegar, selar o local e afastar-nos do interior da casa.
Fomos conduzidos para prestar declarações. O ambiente no ar era tenso. Sofia de olhar vazio e sem vida observava a rua pelo vidro do carro. Sem saber o que fazer, ao certo, apertei-lhe a mão com força e disse-lhe:
-Estou aqui!
Tentou esboçar um sorriso, mas saiu frágil.
Chegámos à sede da PJ e iniciou-se a tortura com horas seguidas de extenuantes interrogatórios. Sempre em busca da falha e da incongruência íamos sendo bombardeados com questões atrás de questões. O cansaço invadia o corpo e depressa chegou a manhã.
Sem dormir e com alguma fome deixaram-me sair. Sofia ficou. Apanhei um táxi e chegado a casa tomei um banho, ataquei o frigorífico e voltei a chamar um novo táxi para me levar até casa da mãe de Sofia, já que, o meu carro havia ficado lá, na noite anterior.
Ainda me encontrava tão atordoado com toda aquela história, não percebia porque não a deixaram vir também. Nada daquilo fazia sentido. Não havia sido ela, tinha certeza disso, pensei.
Estacionei no parque ao lado do edifício da PJ. Estava um dia solarengo e havia gente pelas ruas, na agitação típica de uma metrópole. Entrei. Sofia estava finalmente fora do gabinete de interrogatório. Vi-a ao fundo do corredor, corri até ela, abracei-a e disse:
- Vamos embora daqui, precisamos de apanhar um pouco de ar.
- Não posso, não posso sair para longe, disse-me a chorar.
- Porque? Perguntei.
- Fui constituída arguida! Eles pensam que matei a minha mãe João! Disse-me desmontando-se nos meus braços.
Um impulso gelado correu-me pela coluna, ainda assim, enchi-me de força, contornei os seus ombros com o braço e disse-lhe que tudo iria correr bem. Pelo menos, assim o esperava.
Saímos. Entrámos no carro e não houve uma palavra durante penosos minutos. Não sabia para onde ir, não sabia que fazer. Tentar animar? Temia que tal não fosse acontecer. Parei na praia, não me parecia o melhor dos sítios neste momento, mas tentei. Tudo parecia ignorar o que se passava connosco. O dia brilhante e convidativo, as crianças aos pulos na areia, já cheirava a Verão e nós apedrejados pela mão negra do destino, ou de outra coisa qualquer. Sofia continuava em voto de silêncio. Compreendia-o.
Sentámo-nos num rochedo junto à água. Dei-lhe a mão.
-Tu não está sozinha nisto, não sei se isso vale de algo, mas… Não estás só!, disse-lhe apertando a mão e procurando os seus olhos escondidos.
- Obrigado! Olhou e beijou-me.
Não sabia ao certo como lidar com a dualidade da situação, dei-lhe um sorriso e disse-lhe tentando cair em graça:
- Estava difícil sair um beijo teu, estava!
Devolveu-me um sorriso e encostou a cabeça no meu ombro.
Deixámo-nos ficar por uns minutos assim, olhando o mar, calados.
- Que vou eu fazer agora? Tenho a minha vida destruída! Acusaram-me de ter morto a minha mãe.
- Calma! Eles não te acusaram de nada! Constituíram-te arguida por teres sido a primeira a chegar ao local e enfim, por todo o cenário. Nada mais que isso! Provar-se-á que não foste tu. Tenho certeza disso. Resta-nos arranjar um advogado, coisa que já devíamos ter feito, ainda antes dos interrogatórios e deixar que as investigações comprovem que estás inocente.
Seríamos chamados para depor novamente nessa tarde.
Segundo o inspector eu fora ilibado já que à hora do crime estava no bar e havia passado o dia no trabalho, coisa que fora comprovada pelos testemunhos da Margarida, do Pedro e dos restantes amigos do bar, que concordaram prestar declarações.
Já Sofia corria mais riscos, não tinha álibi.
Depois do jantar passámos pela casa de Sofia para trazer alguma roupa e artigos de higiene pessoal, já que, havíamos combinado que ela ficaria na minha casa, pelo menos, por uns dias.
Sofia entrou no edifício e eu fiquei para trás, detido pelo aparecimento da D. Ermelinda, que num ápice, me lançou um completo interrogatório sobre tudo o que se estava a passar, pois a notícia não demorara a chegar. Tentei abreviar o assunto. Por fim subi. Ao entrar, dou com Sofia estática à entrada da sala, apoiada na parte lateral da porta. Boquiaberto, vejo inscrito na parede, a pinceladas irregulares de tinta vermelha meio escorrida:
- Agora só faltas tu!
Apressados, arrumámos os haveres dela e saímos directos para a polícia relatar o que vimos.
29 junho 2009
Roubaram-me os pneus!
28 junho 2009
Somos escravos...
26 junho 2009
Morreu Mickael Jackson
25 junho 2009
Malditos virus, quando a desgraça aconteçe
23 junho 2009
Frase do dia...
22 junho 2009
O nosso desgoverno...
Enfim, estamos em crise, mas verdadeiramente a crise que vivemos não é apenas económica! É sim de valores! Façamos uma pequena análise, muitos portugueses procuram trabalho ou emprego? (não desvalorizando os que não o conseguem e quem dá no duro diariamente), porque é que inundamos os "trabalhos menores" (esta visão é portuguesa! lá fora isto não aconteçe assim) com os imigrantes? porque insistem os portugueses em viver a crédito e ter à porta de casa uma bmw? porque há em média 3 telemóveis por habitante em portugal? porque não temos dinheiro para comer, mas temo-lo para queimar nas lojas de roupa de nome sonante?
Muitos portugueses não vivem assim. Ainda bem que não. Portugal precisa de acordar para vida e isto é algo que me incomoda. Como pode um pais proliferar se não produz sequer para comer? Continuamos a investir no sector terceário, nos serviços mas como se os portugueses não têm dinheiro para usufrir deles? Apostamos de forma errada. Esqueçemos a industria e o sector primário. Com alimento suficiente e boa produção tornamo-nos semi auto-suficientes, depois sim aposta-se fortemente no sector dos serviços! É elementar este conceito. Assim não aconteçe. Continuamos a inverter a ordem dos factores e assim não se sai disto. Nunca!
Não há poções mágicas, não há políticas melhores que outras, há sim necessidade de realizações concretas do que nos faz falta, basta de teorias o mundo é organizado numa grande complexidade sim, mas que se pode remeter a um principio básico, esse principio é o aconteçer! É só preciso fazer acontecer o que precisa de acontecer!
Beijinhos e abraços a todos
João
20 junho 2009
O segredo
19 junho 2009
Hoje é um dia feliz!
Apenas um dia - Parte 2
Já em casa, resolvi não me deitar. Ajustei a luz da sala, dirigi-me à estante dos discos de vinil. Recorri a Miles Davis. Tirei do pequeno estojo uma escova de cor azul-marinho, cuja superfície lembrava veludo. Com o vinil a queimar no prato ia retirando, cuidadosamente, os indícios de pó na superfície.
A gola da camisa tinha ainda o cheiro do perfume dela, pensei.
Deixei-me ficar ali, em transe, enterrado na poltrona que me havia sido oferecida pelos meus pais e que o cão da família insistia em querer mastigar, nas suas incursões destruidoras pela minha casa.
O sol mostrou-se mesmo no fim do lado B do disco, conseguia vê-lo a rasgar por entre as tiras do estore.
Preparei-me, vesti-me de preto e segui para o trabalho. Fui de metro, já que o atelier era relativamente perto. Involuntariamente ficava sempre a par de todas as notícias, escândalos e intrigas que algumas senhoras, de voz assumida, insistiam em manifestar de um banco para o outro. Protegido pelos óculos escuros tentava, em parte, camuflar o riso contido que a situação me provocava.
O tecer de uma melodia descoordenada, vinda de um jovem de tez escura, com um acordeão, que havia entrado, fez-me reflectir.
A minha saída era a próxima. Acotovelando-me, dirigi-me para a porta que insistia em ceifar membros aos passageiros menos apressados.
Bom dia Sr. Vítor, dê-me o diário do costume por favor! – Disse, dirigindo-me ao quiosque mesmo na esquina do atelier.
Sr. Vítor, boa pessoa, mas sempre mal disposto e cabisbaixo era um homem alto e farto, de cicatrizes profundas infligidas pela guerra colonial.
-Bom dia! – Disse calmo, ao entrar no atelier.
-Olha ele! – Respondeu o Pedro, um dos bons amigos que cultivava desde o tempo da faculdade.
Pousei o jornal e a minha pasta, bati à porta e entrei no gabinete da Margarida, minha sócia e, também ela, ex-colega de turma.
-Bom dia, então? Como está o Filipe? – Perguntei.
-Está melhor, ontem fomos ao médico com ele e depois à vinda adormeceu no carro e tudo. Mudando de assunto, como correram as coisas ontem com a Sofia? – Perguntou, levantando o sobrolho.
-Mais logo conto-te tudo… - Disse-lhe, sorrindo meio envergonhado.
A Margarida sempre foi a minha melhor amiga. Eu até era padrinho do Filipe, o filho dela. Por vezes brincava com a situação. Dizia que me tinha convidado para padrinho apenas porque a tinha ajudado no projecto final do último ano e que como era inteligente e ia ser um bom arquitecto, iria ganhar bem para ajudar a sustentar eventuais afilhados.
Uma mulher muito bonita, alta, um longo cabelo loiro de canudos largos, lindíssimos olhos verdes. Recordo-me de ser vista como o Santo Graal da massa associativa masculina dos rapazes, nos tempos de escola. Por alturas das praxes, os veteranos incentivavam os jovens caloiros a improvisar intricadas odes à beleza de tão delicada “divindade” e das demais colegas recém-chegadas. Margarida respondia sempre com um sorriso maternal, mas, ainda assim com pequenos toques de humor, participando na festa.
O dia foi árduo, como de costume. Tínhamos em mãos um projecto para um novo centro comercial e a pressão exercida pelos investidores apenas atrapalhava.
O almoço foi no Chinês na rua paralela ao escritório, convidei eu. Sabia que provavelmente ia ser bombardeado por perguntas, eles jamais me iriam poupar ao desconforto na revelação dos detalhes da noite passada. Assim foi.
Mas, curiosamente, as questões não foram tão incisivas como esperava. Contei-lhes da conversa agradável que tínhamos tido, que sentia cumplicidade e à-vontade com ela e que, aparentemente, tudo fluía, mas, não havíamos passado muito da amizade, especial certamente, mas amizade. Depois de alguns empurrões na direcção que achavam correcta, assumi a promessa que de tarde lhe telefonaria a combinar algo para essa noite.
-Estou? Que surpresa! – Disse-me Sofia.
-Olá, sim sou eu, então como estás desde há pouco? – Ironizei.
-Estou bem, com sonito, mas bem, e tu? Chegaste a dormir alguma coisa? – Perguntou.
-Não! Estive entretido com os meus discos, se me deitasse penso que ainda me ia sentir mais sonolento. – Respondi.
-Eu nem me lembro de ter chegado a casa, devo ter “aterrado” logo no sofá! – Disse ela, rindo.
-Fantástico! Olha, logo queres ir ao bar do Miguel? – Disse acompanhando o riso dela.
-Oh, desculpa mas logo não posso, vou ver a minha mãe, ainda não estive com ela esta semana. – Disse ela.
-Tudo bem, não há problema, eu em princípio vou lá um pouco, fica para a próxima então. – Disse-lhe.
-Claro que sim! – Respondeu-me.
Falámos mais um pouco, o tempo parecia não existir e não sei ao certo quanto tempo durou a chamada.
Ao final da tarde, a rotina de tantos os dias, apanhei o metro e fui até casa, troquei de roupa por algo mais leve. Não tinha nada preparado para o jantar, pensei. Meti-me ao caminho e resolvi ir ter logo ao Refúgios. Admirado por me ver ali tão cedo, o Miguel preparou-me de imediato uma mesa.
-Já cá estás? Epá hoje vieste mais cedo! – Disse o Miguel.
-Sim, vim fazer uma inspecção sanitária ao estabelecimento. – Disse-lhe num tom de gozo.
-E fizeste muito bem, trago-te já o petisco do dia! - Disse ele enquanto saía apressado.
A casa estava a ficar cheia e ainda era relativamente cedo. Geralmente, serviam pequenas refeições leves e o pessoal ia ficando até tarde, bebia algo e aproveitava a música.
Comi e deixei-me andar por ali, iam chegando rostos conhecidos e dava dois dedos de conversa. Chegaram também amigos músicos e decidimos ir até ao palco tocar alguns standards, para criar um pouco de ambiente.
Estranhamente, ou por ironia do destino não desliguei o telefone, como habitualmente fazia quando estava a tocar. A meio de um dos temas senti o telefone a vibrar. Parei, coloquei a mão ao bolso e olhando o visor, num misto de espanto e alegria, sorri. Era a Sofia. Talvez ainda me venha ver, pensei entusiasmado.
Com o volume elevado e o ruído característico que inundava a sala vi-me forçado a sair para atender. Nada faria adivinhar o que viria a acontecer.
Atendi a chamada com um olá vibrante e enérgico. Do outro lado a angústia em forma de choro e gritos eram tamanhos que o impacto da situação me atordoou por completo.
-Sofia? Estás bem? Que se passa? – Perguntei preocupado.
-João… Socorro, Oh João… - Chorava e gritava Sofia.
-Mas que se passa? Que aconteceu? Onde estás? – Perguntei visivelmente nervoso.
-A minha... a… João… Ajuda-me, Oh... Meu Deus… - As palavras mal lhe saíram, soluçava sem se conter.
-Mas onde estás? Diz-me! Onde estás? – Perguntei, já em estado eminente de crise.
Não obtive resposta. Abruptamente ouvi três cliques e o meu telefone desligou-se, sem razão aparente.
Pálido e sem reacção inicial entrei no bar e saí com as chaves e carteira na mão, a correr como não julgava ser possível. Meti-me no carro que ainda estava a alguma distância, o compasso acelerado dos meus passos na calçada fazia acordar os cães que pernoitavam pelas ruas.
Conscientemente recusei-me a parar em semáforo algum.
A casa dela ficava praticamente no lado oposto da cidade. Tinha que chegar depressa, apenas nisso pensei. Acelerei ainda mais.
Trepei o passeio com a frente do carro, como um louco toquei. Não estava. Apesar da hora tardia bati à porta da D. Ermelinda, a porteira, que me confirmou que a Sofia havia saído para ir ter com a mãe e que até levava uns bolinhos secos que a D. Ermelinda lhe havia feito com todo o carinho. Agradeci a informação e como se a minha vida dependesse disso voei até à casa da mãe de Sofia. Não era muito longe dali, apenas alguns quarteirões acima.
Durante o caminho dei por mim a punir-me de não ter ido directo para a casa da Senhora D. Fátima. Senhora encantadora, já de alguma idade, mas muito bem-parecida, vivia sozinha. O falecido marido fora um importante general das forças armadas e ela, mesmo contrariando a família, havia decidido estudar, formar-se e chegou mesmo a exercer funções de hospedeira de bordo. Sofia sempre teve um contexto familiar de grande união, o sucesso profissional dela também o revelava.
Finalmente cheguei à porta da monumental vivenda, apesar da pouca luz percebiam-se cantarias e beirados típicos, um enorme jardim trabalhado e repleto dos mais exóticos arbustos e flores de uma beleza literária.
A porta estava aberta. Em alerta, temendo um assalto peguei numa forquilha que se encontrava no anexo da garagem, junto com as restantes ferramentas de jardim.
Entrei pela casa de forquilha em punho, guiado por um disparo súbito de adrenalina.
Ouvi o choro e os gritos já mudos de Sofia, como que amordaçada. Vinham do quarto, pensei.
-Sofia? – Gritei.
-João… - Ouvi do fundo do corredor, num ar de lamento já a desfalecer e em murmúrio.
Corri para o quarto. Parei. Involuntariamente caiu-me a forquilha da mão e congelei.
Jazia na cama a Senhora Dona Fátima, num mar de sangue que se escorria pelos lençóis até ao chão, inundando todo o pavimento de madeira do quarto. Sofia abraçada a ela, coberta de sangue, afagava com a mão o cabelo da mãe.
Olhei, e em choque percebi, que a senhora sustentava no peito três facas que a dilaceraram num rasgo demoníaco de violência demente e erradamente cinematográfica.
Cai de joelhos ao lado de Sofia, abracei-a e chorei.
18 junho 2009
Parte 2 de "Apenas um dia"
Apenas um dia – Conto/Romance - Parte 1
Parte 1
Noite. Tacteava o pulso num acto repetitivo, rodei o relógio para conferir o tempo. Estava a chegar a hora. Nunca me atrasava.
No quarto, agarrei um perfume e expulsei do frasco um pouco do aroma, em mim. Dirigi-me à cadeira, peguei no blazer e encostei o dedo ao interruptor do candeeiro de mesa e desliguei-o. O tom pastel da luz desvanecia-se aos poucos, aquela luz que tantas noites me acolheu enquanto me resguardava no silêncio característico de quem se deita a fazer o balanço de um dia.
Lá fora as constelações levantavam-se e mapeavam o céu, conhecia bem o enquadramento. A imagem dos serões passados no parapeito da janela percorria-me a memória. Tinha que ir.
As ruas estavam vazias. Tão morta estava cidade naquele instante. Contraste incómodo, já que durante o dia, o ar, quase se tornava rarefeito na concentração épica dos espaços públicos. Estacionei, orientado pela luz de um candeeiro de pé alto já fustigado pelo tempo e pelos descuidos dos carros. Era apenas mais uma noite, pensei.
O som das pedras da calçada ecoava nas paredes dos edifícios, também eles envelhecidos. Estava-se a perder esta arte, já ninguém faz verdadeira calçada portuguesa! Ser-se pedreiro não é “nobre”, incomodado, pensei.
Ao fundo da rua avistava-se um resquício de luz que iluminava o chão, aproximei-me e entrei. Sorridente, Miguel, dono do bar, cumprimentou-me. Devolvi-lhe com agrado um sorriso e um forte abraço adornado com um aperto de mão. Era-me familiar aquele espaço.
-Queres vir tocar hoje? – Perguntou Miguel.
-Hoje não… hoje preciso de arrumar a cabeça e aguardo companhia. – Disse-lhe aproximando-me do balcão.
-Claro! Como é? Sai um duplo sem gelo? – Perguntou-me, já com o copo servido na mão.
-Chuta! – Disse-lhe num tom amigável.
Do banco alto rotativo era possível ver todo o interior, as pequenas mesas escuras de madeira de carvalho e de cantos trincados, o balcão corrido de granito decorado com protuberâncias em metal dourado, os jogos de luz por entre as tiras de fumo, aquela imponente garrafeira de iguarias exóticas e os cálices pendurados pela base. Todo o ambiente fazia lembrar um bar ao jeito Irlandês. Mesmo ao lado do balcão, no canto esquerdo do salão, existia um pequeno palco ladeado por duas mesas redondas e um sofá vermelho carmim já manchado pelo álcool, onde os músicos se encostavam durante os intervalos e por vezes só pelo hábito, como se de um território marcado se tratasse. As paredes, essas, tombavam repletas de recortes de jornal, revistas e fotografias de amigos, de músicos promissores e outros mais afirmados.
A noite foi-se desenvolvendo normalmente, entre goles de bebida, um olhar pelos títulos de jornal e pequenos diálogos com rostos conhecidos que partilhavam conversas de circunstância comigo.
Era um pouco tarde, o compromisso e a responsabilidade profissional impediam-me de ficar por ali muito mais tempo, além do mais, o cansaço começava a fazer-se sentir.
Afinal não vem – disse para mim, murmurando.
Estava praticamente a sair quando entrou Sofia. Uma mistura de nervosismo e de positiva ansiedade percorreu-me o corpo. Senti o batimento cardíaco a manifestar-se. Aproximou-se de mim e cumprimentou-me. Era suave e floral o perfume que trazia, mas ainda assim, penetrou na minha roupa. Sentia o aroma.
De pose decidida e assumida, mas ao mesmo tempo angelical, desviava sempre a atenção dos homens que se movimentavam em seu redor. Não era o primeiro encontro, mas em mim tudo fazia parecer que sim.
-Boa noite! Então como está a donzela? – Perguntei.
-Estou muito bem e o cavalheiro? – Disse-me, esboçando um sorriso aberto.
-Estou bem também, a menina acompanha-me numa bebida, ou prefere apenas um café?
-Um cafezinho, simpático cavalheiro – disse-me em jeito teatral.
Tentava, com humor, quebrar o gelo do contacto inicial e de alguma insegurança na situação, sempre era assim, tímido e desastrado. Porém, a linguagem corporal deixava-me ficar mal e depressa denunciava o meu estado.
Conversámos um pouco sobre o nosso dia, as novidades, fragilidades e saboreámos a partilha de alguns sonhos futuros que íamos montando no decorrer da conversa.
Não era fácil libertar-me de a contemplar. O seu cabelo longo, liso, sedoso e negro, pele de aroma a jasmim, olhos cintilantes e mágicos. Tanta harmonia naquele olhar, fazia-me bem. A delicadeza do sorriso e de como movia as mãos, como que no acto ritual de charme inconsciente, cativava-me ainda mais. Dou por mim a congelar o tempo e a pensar como temia perder-me a olhar o corpo e não ver a mulher. Erro comum. Por momentos senti que ela partilhava, igualmente, de algum nervosismo ou pelo menos uma qualquer insegurança nas reacções, talvez vindo de um passado menos feliz, talvez não muito diferente do meu. Por fim os dedos tocaram-se… As mãos uniram-se. O tempo cristalizou por instantes. Cúmplices foram os olhares e os sorrisos quase adolescentes. Mas, nessa noite nada foi mais que isso, ou melhor, foi tudo isso…
17 junho 2009
Verão, esse amigo...
16 junho 2009
Estes Chineses inventam tudo...
E aí vem ele... O TGV
Hoje!
Vale a pena ouvir...
Bem vindos ao Plataforma
Beijos e abraços
João